Eleições via internet é polêmica no plenário do Confea
Em um ano eleitoral, também para o Sistema Confea/Crea – composto pelo Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Confea), pelos 27 Conselhos Regionais (Creas) e pela Mútua-Caixa de Assistência dos Profissionais dos Creas -, a viabilidade da realização de eleições via internet foi tema de debate no último dia 30 de abril, durante a sessão plenária do Conselho Federal. Destacaram-se aspectos relativos à democratização, representatividade, segurança, transparência e fiscalização no processo eleitoral.
A Resolução do Confea nº 1.021/07 aprova os regulamentos eleitorais para as eleições de presidentes do Confea, dos Creas e de conselheiros federais. No normativo existe uma autorização para que seja implementado o voto pela internet, mas a decisão deve ser aprovada pelo plenário do Confea, composto por 21 conselheiros federais.
Neste ano, as eleições serão para a renovação do terço do Confea e dos Creas, ou seja, no caso do Confea, que dispõe de 21 assentos, sete serão renovados. Em 2011, assumirão o mandato no Federal um representante de cada modalidade: Engenharia Elétrica (Mato Groso), Técnico Industrial (Maranhão), Arquitetura (Minas Gerais), Engenharia Civil (Rio Grande do Sul), Agronomia (Mato Grosso do Sul), além dos representantes das instituições de ensino, que para 2011 elegerão as modalidades de Arquitetura e Técnico Industrial.
O advogado Luiz Filipe Coelho, assessor jurídico da Comissão Eleitoral Federal (CEF), apresentou uma proposta de investimento conceitual. “Tenho a impressão de que seja inevitável que caminhemos para o processo eleitoral via internet. Mas não sei se cabe ao Sistema Confea/Crea capitanear o desenvolvimento de um software para esse fim. Acredito que isso deva ser feito pelo mercado”, afirma. “Imagine quantas pessoas não estão desenvolvendo esse produto para vendê-lo para consumidores potenciais como o Confea”, questiona.
Ele acredita ser essencial a discussão sobre a garantia do sigilo do voto no caso de se utilizar a internet. “Hoje, nem mesmo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) permite que se entre com o celular para que o eleitor não seja coagido a fotografar seu voto por alguém que tenha interesse. A chancela do TSE no fornecimento das urnas eletrônicas garante, hoje, a ética, a igualdade, a transparência e a isonomia que queremos no processo eleitoral”.
O conselheiro Etelvino de Oliveira Freitas, no entanto, expôs uma série de motivos pelos quais acredita que a permanência da votação por meio da utilização de urnas eletrônicas ou de lona seja mais favorável atualmente. Segundo ele, a integridade lógica de sistemas eleitorais complexos não é matéria de solução trivial e carece de debate mais aprofundado. “Não existe consenso e nem norma técnica sobre segurança de sistemas eleitorais na internet”, afirma. Assim, declara que adotar esse novo procedimento pode prejudicar a transparência e a segurança do processo eleitoral, o que contraria a postura do Sistema Confea/Crea, integrante do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE) e iniciador do Movimento Anticorrupção da Engenharia, da Arquitetura e da Agronomia. Ele considera ainda que não se pode ignorar que existem forças políticas e econômicas interessadas em manipular e burlar o resultado de uma eleição e a internet pode propiciar essas fraudes.
Já o conselheiro Roberto da Costa e Silva, que atuou na área de segurança de telecomunicações, afirma: “Não existe sistema seguro. A própria física diz isso. Jamais vamos ter uma segurança absoluta”. Entretanto, para ele, esse não pode ser um impedimento para utilização desses sistemas. “Se não houvesse alguma segurança, ninguém utilizaria conta bancária administrada pela internet, ninguém andaria de avião. Até mesmo no voto eletrônico, o desejo do eleitor está dentro de uma urna que vai ser enviado e computado eletronicamente por um sistema”, diz. Ele afirma que a segurança deve ser, sim, observada, mas lembra, por exemplo, que na Bahia, os conselheiros são eleitos com cerca de 3% dos votos e o uso da internet deveria garantir mais representatividade. De mesma opinião, o conselheiro Kleber Souza dos Santos, acredita que, apesar de a internet não resolver tudo, pois existem problemas de mobilização e acesso à internet, sua utilização significa um grande passo para a ampliação da participação da população e dos segmentos sociais.
No entanto, para o conselheiro Pedro Shigueru Katayama, não se trata de ampliar o número de votantes, mas de garantir a participação de votos de qualidade, dos profissionais que efetivamente atuam no Sistema. “Para mim, as discussões sobre quantas mil pessoas votam é irrelevante. Além disso, como garantir a lisura, a transparência e a seriedade nesse processo? Nós queremos votos de qualidade. Que votem poucas pessoas, mas que o façam conscientemente”.
A conselheira Ana Karine Batista de Sousa também disse acreditar que o uso da internet não traz a democratização, mas a discriminação de vários estados onde grande parte da população não possui acesso à internet. Em sua opinião, no contexto atual, essa é uma discussão infundada. “Não há necessidade de se impor um assunto dessa natureza”. Ela sugeriu que esse debate fosse tratado durante os Congressos Estaduais e Nacionais de Profissionais. “Profissionais de todo o Brasil, de todas as modalidades poderão opinar de forma igualitária sobre o assunto”, afirmou.
Durante o debate em plenário, o conselheiro Idalino Hortêncio defendeu a discussão em um fórum mais amplo, como o CNP, por exemplo, para que as discussões ultrapassem o plenário do Confea. “Não somos contra o crescimento tecnológico do Sistema. Mas temos que ser prudentes, Não posso concordar que os conselheiros votem “sim” ou “não” para as eleições pela internet sem antes haver um debate com subsídios, para que todos possam votar tranqüilos”, afirmou. Procurado pelo E-Confea, Idalino Hortêncio disse ser contrário às eleições pela internet neste momento. “Posso ter outra opinião amanhã. Mas hoje creio que por uma série de argumentos as eleições pela internet não são adequadas para o Sistema Confea/Crea”, afirmou. Entre esses argumentos, ele citou questões estruturais, como a tecnologia, por exemplo. “Para 2010, o cronograma da Gerência de Tecnologia da Informação do Confea está inviável. Também não vejo que o ideal seja fazer as eleições em 2011, uma vez que será o ano de eleições para presidentes de Creas e Confea, além dos conselheiros. Não creio que o ano de eleições gerais do Sistema seja o momento de fazer o piloto das votações pela internet. Para ele, o piloto tinha que ser este ano e, por isso, este debate deveria ter começado o ano passado. Além das questões estruturais, o conselheiro discorda daqueles que acreditam que a internet mobilizará maior participação dos profissionais no processo eleitoral. “Hoje fazemos debates, discutimos, antes das eleições. Se tivermos internet, creio que perderemos essa discussão”, argumenta. Ele sugere que o plenário busque outros mecanismos para ampliar a participação dos profissionais nas eleições, como o voto obrigatório. Idalino acredita que eleições pela internet não garantem a inviolabilidade dos votos. “No mundo inteiro não se usa eleições pela internet por causa desse problema” justifica.
Também ao E-Confea, o conselheiro Martinho Nobre, que é coordenador da Comissão Eleitoral Federal, disse compartilhar a opinião de Idalino. “Eu sou a favor das eleições pela internet. Mas creio que para este ano fica inviável, porque tecnicamente há uma série de providências que deveriam ser tomadas que demandam tempo”, afirmou. “Como coordenador da Comissão Eleitoral, sei que temos um calendário a cumprir e, ao consultarmos a Gerência de Tecnologia, percebi que a demanda de tempo que seria necessária para implantação não daria certo com o calendário eleitoral deste ano”, explicou. Martinho disse acreditar que o assunto deveria ser mais amadurecido dentro do Sistema.
O tempo também foi ressaltado pelo conselheiro Pedro Lopes, que cita esse fator como o único empecilho para que não se implante as eleições online ainda neste ano. “A tecnologia está avançando e temos que acompanhá-la. No entanto, quando soubemos que a Gerência de Tecnologia necessitaria de seis meses para implantação do sistema de eleições pela internet, tivemos que adiar o processo”, disse. Ele concorda com o conselheiro Idalino Hortêncio ao se posicionar contra as eleições online também no ano que vem, por se tratar de eleições gerais, com escolhas para presidentes de Creas e do Confea. “Não é questão de ser a favor ou contra, mas, sim, do momento. Nas eleições gerais, a votação é muito ampla. Não dá para usar um sistema desse porte pela primeira vez. Podemos tentar em 2012”, sugeriu. “A tecnologia existe e não podemos ficar aquém. Mas temos que aderir a ela apenas no momento em que ela nos propiciar segurança”.
O conselheiro José Roberto Geraldine Júnior, por sua vez, fez referência à opinião do ministro do Supremo Tribunal Federal e ex-presidente do TSE, Carlos Ayres Brito, que considera inevitável a mudança do processo eleitoral para um sistema que utilize a internet. Geraldine lembrou que a Suíça é um dos lugares mais seguros para se guardar dinheiro e sua população realizou as últimas eleições federais pela internet. Para ele, ampliar e democratizar a participação dos eleitores são benefícios trazidos pela internet. Sugere, assim, que o debate seja aprofundado dentro do Sistema Confea/Crea, com a participação de especialistas.
Na mesma linha o conselheiro Anderson Fioreti de Menezes afirmou: “Acho que esse Sistema tem o dever de gastar todos os recursos necessários para avançar nesse processo eleitoral brasileiro. É daqui que se tem como avançar e seria muito interessante que fosse a partir do exemplo do nosso processo eleitoral interno”.
Para Marcos Túlio de Melo, presidente do Conselho, o processo eleitoral do Sistema Confea/Crea já apresenta evolução em relação a outros órgãos. “A Constituição Federal não impede que a eleição seja indireta. Há órgãos que até hoje realizam eleições indiretas. Já evoluímos e há muitos anos não fazemos mais eleições dentro dos plenários”, afirmou. Para ele, o voto “é um direito, não uma obrigação”, e por isso é preciso “ver as maneiras para que esse voto possa ser de fato exercido”.
Debate adiado
O assunto tomou tempo da Sessão Plenária de abril, pois estava em pauta a Deliberação nº 11/2010 da Comissão Eleitoral Federal do Confea, que previa a implantação de sistema eletrônico de votação por meio da internet. Após o debate da manhã desta sexta-feira, o conselheiro federal Idalino Hortêncio pediu vista à matéria e apresentou seu relatório de voto à tarde. Seu parecer sugere que as eleições de 2010 e 2011 sejam realizadas por meio convencional. No entanto, a proposta do conselheiro é que ações sem custos sejam dinamizadas para viabilizar “de forma segura jurídica e operacionalmente” uma futura implantação do sistema de votação pela internet. O parecer foi aprovado por 12 votos do plenário, com sete votos contrários, uma abstenção e uma ausência.
O conselheiro Martinho Nobre, coordenador da Comissão Eleitoral Federal (CEF), explicou que, este ano, provavelmente o processo eleitoral ocorrerá por meio de urnas de lona somente. “Como temos as eleições do Brasil neste ano, creio que as urnas eletrônicas que o Tribunal Superior Eleitoral nos empresta normalmente não estarão disponíveis”, esclareceu. A respeito da implantação de ações sem custos para viabilizar uma futura eleição online, o coordenador da CEF disse ao E-Confea acreditar que não é há como fazer isso sem custos. “Creio que esses estudos não vão acontecer”.
As sessões plenárias são transmitidas pela internet, sendo que, durante o debate sobre as eleições, mais de 1,6 mil pessoas acompanhavam as discussões.
Texto : Tânia Carolina Machado e Beatriz Leal
Assessoria de Comunicação do Confea